Trabalhei por mais de 30 anos como publicitária e executiva de marketing em empresas. Nunca fui muito vaidosa, então me maquiava o básico para o dia a dia: lápis, rímel e batom eram meus aliados. Só agora, na pandemia, quando passei mais tempo explorando as redes sociais, foi que me dei conta do poder de uma maquiagem bem feita. Pode literalmente mudar o rosto da pessoa! Isso sem falar dos procedimentos estéticos que vão nos moldando dentro dos padrões que a sociedade impõe.
Com a nossa atual superexposição de imagem, cresceu também o questionamento sobre a artificialidade dos modelos de beleza. É inevitável que a gente se compare, se julgue e julgue os outros de acordo com um ideal estético, e até de saúde, que pode nem ser o ideal para nós. Há pouco tempo, li um artigo que fazia um histórico da celulite, mostrando que nos anos 50, com a entrada da mulher no mercado de trabalho e o consequente aumento do poder aquisitivo e de decisão, a celulite é apresentada por médicos como uma “doença”, coisa de mulheres, a ser tratada como questão de saúde mesmo!
Com quantos mitos destes nós somos oprimidas, sem nem termos consciência? Quantos destes ideais que nos limitam foram normalizados na nossa vida, por décadas de aculturamento? Na sociedade de consumo, é importante gerar demanda. Tendo as mulheres como alvo, a ideia é gerar insegurança e insatisfação, para assim vender soluções para os “problemas” que são criados.
Por isso, é importante que a gente se questione sempre que for julgar uma situação e, mais ainda, sempre que julgarmos a nós mesmas! Quando Madonna apareceu com o rosto inchado de botox ou sei lá o que ela fez, minha primeira reação foi a de muitos dos meus amigos: putz, tá horrível! Mas o fato de ser Madonna, essa mulher tão transgressora, me fez pensar: ela quer rejuvenescer, se enquadrar? Não parece que ela tenha mudado tanto assim de personalidade. Então, vai ver que ela acha bonito! Sim, não só ela, como várias jovens, menos de 20 anos até, fazem preenchimento labial, botox na cara toda... porque elas devem achar bonito assim. Mas como era uma mulher mais velha, já vem o povo dizendo que ela quer ‘rejuvenescer’. Todo mundo sabe a idade dela, então fica difícil esconder. Gosto estético não é igual, se a mulher está se sentindo feliz assim, isso é o que importa. Vale sempre a gente avaliar se não está se sentindo feliz porque está atendendo a um padrão estético que não é o seu na verdade, e sim um imposto pela estética machista, onde barriga de homem é charme, a de mulher não...
Outro dia eu estava fazendo uma sessão de fotos na praia, modelando para uma grife de vestidos lindos e super originais. Acabei chamando mais ainda a atenção de todos porque a fotógrafa me desafiou a tirar fotos numa prancha de standup paddle, que eu nunca tinha andado! Deu tudo certo, só caí na água quando fui descer da prancha, depois das fotos rs. Tinha uma mulher madura nadando lindamente perto de mim, quando eu estava na água, e aí ela veio falar comigo. Elogiei a boa forma e a disposição, e ela achou que eu estava brincando, porque o corpo dela não está dentro dos padrões magros... e confessou que ela trabalha com turismo, pensava em divulgar seu trabalho nas redes sociais, mas tinha muita vergonha de se mostrar, pois não se via dentro do padrão esperado. Venho bombardeando-a de exemplos de mulheres que romperam estes tabus e estão lindas e loiras (pra usar o clichê), lindas e gordas, lindas e grisalhas, lindas e como elas quiserem, divando por aí. Espero que logo logo ela vire também um exemplo de quebra de auto-barreiras e, esteja mostrando toda a sua potência.
Já eu venho quebrando minha resistência em ‘disfarçar’ imperfeições, e usando os truques de maquiagem que aprendo para me sentir mais bonita. Na verdade, é preconceito meu o ‘disfarçar’. O que faço é ressaltar ou minimizar traços do meu rosto que, assim, ficam mais harmônicos. Sou tão hiponga que, pasmem, eu achava que isso era falsear imagem... Claro que quando vou mostrar efeito de ação de produtos de redução de rugas, por exemplo, faço de cara lavada. Cada momento do seu jeito!
Cada uma de nós temos nossas crenças limitantes; não tem receita e não é fácil a gente se empoderar. E ainda precisamos ter atenção sempre sobre nós, nossas vontades e desejos, e sobre o que nos é normalizado, mas que não nos faz felizes nem plenas. Como diz o ditado: “o preço da liberdade é a eterna vigilância”. Vigiemos, pois, a nós mesmas, e deixemos pra quem não tem o que fazer ficar vigiando os outros!
Ana Lucia Leitão para a coluna 50+
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