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A História de Superação de Uma Mulher Incrível

Elaine Alves é uma sobrevivente. Esta goiana de trinta e três anos, de olhos verdes, tons claros e sorriso meigo foi abusada fisicamente, emocionalmente e psicologicamente por todos a sua volta e durante anos de sua vida. Sua história é, sem sombra de dúvidas, uma das mais impactantes e tristes que já escutei.

Ela traz no peito um passado cheio de amargura e dores, no qual a pequena menina aprendia a respeitar os limites para brincar ou os conselhos de sua avó, para servir, com resignação e complacência, os homens que comandavam sua vida.


Confira a entrevista completa:


Espancada pelo Pai

Mantida em cárcere privado durante sua infância, Elaine era constantemente espancada pai, em todas as vezes em que simplesmente sentava-se no portão da sua casa ou quando ia jogar bolinhas de gude com seu irmão no quintal de terra batida… ela usava roupas de manga comprida para esconder as marcas do espancamento e tomava banhos de “salmoura” para aliviar as dores que sentia, após as agressões.

Certa vez, sentindo muitas dores, Elaine implorou para que sua madrasta a levasse a um Pronto-socorro. A madrasta se recusou a levá-la, alegando que ela iria fazer com que prendessem seu pai, e que, só o fato dela pensar nisso já a tornava uma menina ingrata, incutindo, aos poucos, um sentimento de culpa na menina.

A educação que recebia de sua avó era a de que ela deveria servir e satisfazer o “homem”.  Era ela, uma sombra dos pensamentos de sua avó, que, por pura ignorância e falta de entendimento da vida, acreditava fielmente que o lugar da mulher era qualquer um atrás dos desejos masculinos.

Com o tempo, a doce menina tomou coragem para se abrir com a dona da cantina do colégio que frequentava, e contou um pouco das atrocidades que vivia sob o couro trançado e ressecado com cerol, que atingia voluntariamente sua pele branca, obedecendo a voz de comando do seu velho pai, toda vez que ele sentia vontade de bater em algo.

A mulher se comoveu com a história e sugeriu que Elaine se envolvesse com seu filho, alegando que seria um sonho tê-la como nora. O que a moça da cantina não falou para Elaine, na época com quinze anos, era que seu filho já não era mais um menino e sim um homem de vinte e oito anos, e o único dos três filhos que era fértil, capaz de dar netos para a senhora manipuladora.

Certo dia, José* foi até a casa de Elaine para pedi-la em namoro ao seu pai e, assim que o jovem rapaz saiu da casa, o pai espancou Elaine quase até a morte e a impediu de ir ao colégio de novo. Foi quando a madrasta resolveu intervir e arquitetou um plano para que a menina fugisse com o pretenso namorado em uma das viagens do pai.

Após três meses morando na casa da dona da cantina, Elaine se casou com seu filho, na esperança de que, finalmente pudesse encontrar um pouco de paz em sua vida. Mas mal sabia ela que seu novo inferno estava só começando…

Mantida em Cárcere Privado

Elaine se tornou uma escrava nesta casa, executando todos os serviços domésticos e sendo explorada sexualmente pelo marido. Ela era xingada constantemente pela sogra e levava cuspidas na cara do cunhado mais velho. Sua menstruação era controlada por todos na casa, já que o objetivo da família ao acolher Elaine era de que a menina gerasse filhos para satisfazer ao desejo de netos da matriarca e dos inférteis irmãos.

O tempo foi passando lentamente pela doce menina, que era obrigada a conviver com uma série de abusos inacreditáveis, a ponto de ser violentada sexualmente por seu próprio marido, a cada quinze dias, quando o mesmo se dignava a visitar o lar que havia abandonado. Ela não podia reclamar, não podia chorar, não podia falar.

Quando se queixava para sua sogra recebia o mesmo conselho de sua avó materna: de que a mulher deveria servir ao homem; que era a sua obrigação. E se doesse? Bastava tomar um gole de cachaça para disfarçar a dor do corpo e, assim, poder abrir suas pernas de forma mais proveitosa para o seu homem.

Assédio Moral

Elaine percebia sua filha de quatro anos muitas vezes ficava tensa ao abraçá-la e escutava da pequena menina as dúvidas que surgiam em sua cabecinha, provenientes de conversas com sua avó paterna. Foi quando Elaine se deu conta de que a sua sogra não queria, nunca quis, apenas que Elaine gerasse netos para ela. Ela queria que Elaine gerasse “filhos” para ela. A sogra de Elaine queria assumir a maternidade de seus filhos.

Quando Elaine colocava uma roupa na menina a sua sogra arrancava a roupa, colocava outra e rasgava o vestido escolhido por Elaine. Quando Elaine falava algo para a filha, a sogra desmentia o assunto e, cada vez a situação piorava…

Logo após esta constatação, Elaine se descobriu grávida do segundo filho. Ela reuniu todas as suas forças que restavam e planejou se mudar deste inferno, assim que a criança nascesse. No dia do parto, Elaine seguiu sozinha para Brasília, já que o hospital da pequena cidade onde morava estava fechado. Seu marido continuava viajando pelo mundo para viver aventuras com diferentes mulheres e sua sogra jamais iria lhe ajudar…

Quando seu filho menor tinha quatro meses, Elaine, finalmente, saiu da casa de sua sogra e alugou um quarto nos fundos de da casa de uma senhora de idade. Ela conseguiu dois empregos e pagou para uma menina olhar seus filhos enquanto ela trabalhava.

Porém, a tão sonhada paz ainda não chegaria para a vida de Elaine… nestes dois meses o conselho tutelar batia a sua porta para tentar comprovar as alegações feitas por sua ex-sogra e seus ex-cunhados de que as crianças sofriam agressões por parte de Elaine. Claro, era uma cidade pequena, todos se conheciam, menos Elaine, a quem havia sido confinada em casa, em cárcere privado, impedida de sair para onde quer que fosse…

“Elaine é uma mulher que apanhou com cabresto, que foi assediada incontáveis vezes, que teve sua liberdade ceifada e seus filhos arrancados de seus braços.”

Em um final de semana ela deixou seus filhos para fazer a visita com o pai e só conseguiu reaver seus filhos alguns anos depois. Sim, o pai não os devolveu os filhos, ao contrário, seguiu seu caminho de viagens e mulheres pelo Brasil e delegou seus cuidados a sua mãe. Seu ex-cunhado, o irmão mais velho de José* era muito amigo do conselheiro tutelar da cidade, quem convenceu Elaine de que ela estava em uma situação muito frágil: mulher, sozinha, sem ajuda de um familiar e sem dinheiro jamais conseguiria ganhar nada na justiça.

Elaine acreditou em suas palavras e foi para o Brasília tentar a vida. Lá chegando, encontrou a ajuda de mulheres que investiram em seus serviços de manicure, custeando as ferramentas e a indicando para outras mulheres.

Com o tempo, Elaine conseguiu se reerguer e resgatar a guarda de seus filhos. Hoje ela é uma mulher bem-sucedida e, segundo suas próprias palavras, muito feliz a agradecida a Deus.

“Elaine é uma brasileira entre milhões de outras que viveu diariamente uma realidade bem diferente da realidade exposta nas redes sociais das mulheres livres.”

Para mim, o mais incrível desta história toda é perceber a luz de Elaine através da sua voz suave pelo telefone; ela não traz amargor nem revolta em seu tom. Elaine cita sua mãe como uma sofredora maior que ela própria; uma mulher que foi entregue para o matrimônio com menos de treze anos de idade, que apanhou demais, a ponto de ter tido perda óssea em função dos espancamentos e que hoje vive uma depressão intensa, fruto das sequelas emocionais a que foi submetida.

Elaine não se refere ao seu pai, ao seu ex-marido e ex-cunhado com ódio ou qualquer menção de revolta. Ela tem horror dos três e treme sua voz ao relatar o inferno que viveu em suas mãos, mas não deseja mal algum a eles, que lhe tiraram tanto em vida.

Ela parece não ter uma mágoa da avó materna e da ex-sogra pelo mal que essas mulheres lhe fizeram, e consegue, no alto de toda sua benevolência, compreender que ambas as mulheres não tiveram a instrução necessária para ultrapassar o machismo estrutural no qual nosso país está afundado.

Elaine é uma mulher que passou por um “campo de concentração emocional” bem aqui, no nosso país, no interior desse Brasil enorme e machista; é uma mulher que apanhou com cabresto, que foi assediada milhões de vezes, que teve sua liberdade ceifada e seus filhos arrancados de seus braços. Elaine é uma brasileira entre milhões de outras que viveu diariamente uma realidade bem diferente da realidade exposta nas redes sociais das mulheres livres.

Hoje Elaine é uma mulher livre em todos os sentidos, livre no corpo, na alma e nos sentimentos. E usa sua voz suave para dar voz a todas as outras mulheres e meninas que ainda estão presas em relações abusivas e imorais.

Elaine é uma sobrevivente da vida.

E Maria Scarlet reverencia seu brilho! Salve!!!

* Obs: José é um nome fictício

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