Vivemos em uma era em que tudo deve ser absolutamente perfeito aos olhos de quem sabe olhar. Vivemos de aparências e, a cada menor ruga ou comportamento minimamente “fora do padrão”, nos vemos obrigados a corrigir o problema ora criado, ora diagnosticado.
Mas, se formos a fundo analisar todas as psicopatias e doenças funcionais existentes no mundo, perceberemos que existem milhões e que, invariavelmente, sofremos um pouco de algumas (muitas) delas… e foi assistindo ao novo filme dos antigos personagens que marcaram uma época que descobri as compulsões e esquisitices dos meus amigos velhos, que ainda vestem as mesmas roupas e que compadecem dos mesmos males de antes.
Qual a diferença agora? A diferença é que agora esses desvios são diagnosticados, nomeados e tratados. Esses desvios acabam por sustentar uma rede de consultas, terapias e remédios que são fabricados para “acertar”os indivíduos perturbados com a tal ‘síndrome”ou com o tal “desvio”, em uma cadeia quase infinita de necessidade x cura.
Tomemos, por exemplo, o caso da Magali, a menina gulosa da Turma da Mônica: antes ela era vista como uma personagem engraçada no meio de uma turminha divertida. Era a “gulosa da turma”, aquela menina que não podia ver comida que… comia! Não obstante ao fato de que, realmente existem pessoas que padecem desta doença, o fato da Magali ser gulosa nunca foi motivo de alvoriço, era apenas uma menina que gostava de comer (muito). Mas a verdade é que a sua adoração por comida não é engraçada, é algo sério que leva milhões de pessoas à morte no mundo, devido à gravidade deste TRANSTORNO ALIMENTAR.
Outro fato icônico e que sempre foi motivo de risos é o “Cascão”, o menino leva este apelido porque acabou criando uma espécie de “casca” em torno do seu corpinho pelo fato de, simplesmente, detestar o contato com a água. Seria cômico se não fosse também uma doença. É chamada Hidrofobia (ou aquafobia), e é um transtorno psicológico caracterizado pelo medo excessivo ou irracional de água. Então, na verdade, não seria politicamente correto rirmos das desculpas do personagens para não se molhar, afinal essas desculpas são parte de uma fobia, que no caso dele está em um estágio bem avançado e, até perigoso.
Outro caso que nos remete à gargalhadas é o querido e doce Cebolinha, aquele menino que troca a vogal “r” pela vogal “l”; é até engraçadinho e seria bonitinho se não fosse também um desvio, um probleminha para ser tratado por fonoaudiólogos, e se chama “Dislalia”, um distúrbio da fala, caracterizado pela dificuldade em articular as palavras. De forma leiga, avalio esse problema como um dos menores problemas apresentados pelos quatro membros da turminha querida, mas é importante observar que, em tempos modernos de bullying todo cuidado é pouco…
Para finalizar esse balaio de gato das “doençinhas” dos nossos queridos amigos da infância, vamos terminar com o problema da representante da turminha, a nossa dentucinha gorducha Mônica! Ela apresenta claramente um desvio de comportamento que, se fosse manifestado por alguma criança em pleno ano de 2019, esta seria levada imediatamente a um sofá de um psicólogo ou psiquiatra, com uma análise, no mínimo, suspeitosa para possíveis traumas, assédios ou mesmo algum bullying de um passado não muito distante. Será que a Mônica sofre de transtorno de irritabilidade momentânea ou será que ela pode sofrer de “distimia”? (Distimia é um tipo de depressão crônica: mau humor constante / pessoas de difícil relacionamento / estão sempre irritados / têm personalidade e temperamento complicado). Não sou psicóloga, mas avalio que o comportamento da Mônica não seria aceitável para os padrões atuais.
Resumindo: os nossos personagens dos gibis são muito mais felizes dentro dos seus gibis, onde tudo é possível e nada tem problema de verdade. Aqui, do lado de fora dos gibis, a vida é muito, mas muito mais complicada…
Cris Coelho para a coluna Maternidade