Desabafar como mãe é quebrar crenças, paradigmas e até mesmo culturas. Mas, acima de tudo, é quebrar a si mesma em muitos pedaços até que cada detalhe tenha um significado, ainda que não facilmente entendido ou resolvido.
Tratei em quase todos os artigos aqui sobre as escolhas e os desafios de ser mãe, porém percebi que fiz isso como se segue uma linha cronológica, ou como se vocês esperassem que conversássemos conforme cada nova dúvida existisse, cada nova etapa se apresentasse, mas não apenas porque percebi que vocês não estão todas no mesmo estágio, e sim porque precisei compreender que eu, como mãe, vivo três estágios diferentes todos os dias na minha casa, já que meus filhos hoje possuem 19,14 e 6 anos, conseguem me entender?
Por isso, hoje eu pulei um monte de etapas e vim conversar sobre um momento que talvez seja o mais delicado para a vida de uma mãe: a adolescência. E, caramba, vou confessar e chocar muitas de vocês com uma afirmação que discursei quase que toda a minha vida adulta: eu detesto adolescentes.
Eu sei, eu te choquei de uma forma horrorosa, mas se vamos desabafar, vamos sempre pela verdade, combinado? Então eu, verdadeiramente detesto adolescente, e ainda assim, com dois em casa, que, claro, vivenciam essa fase de formas diferentes, ainda que ambos me enlouqueçam, eu amo os meus filhos adolescentes.
A questão é: como conviver com uma criança com os hormônios bagunçados, que vive em uma realidade que, assuma, não é mais a sua, com todas as questões diferentes, as necessidades gritantes e o acréscimo de que eles tentam a todo custo inverter os papéis, eles querem ser os pais. Eu menti? Você sabe que não. Então você sabe que adolescentes são seres detestáveis.
Mas por que eu trouxe isso? Bom, como colunista de “desabafo de mãe”, trago para vocês a minha vivência e amo poder acompanhar a de vocês. Passei um mês atirada no fundo do poço - quem é mãe de adolescente entenderá - porque minha linha de conversa com um dos meus adolescentes, de repente, sem que eu consiga entender o motivo, se partiu. Eu virei a inimiga, a que toda e qualquer palavra, todo e qualquer gesto era interpretado como se fosse para maltratá-lo.
E não, não aconteceu há um mês, ele tem 14 anos e eu sei, você sabe, todo mundo sabe que as coisas vão acontecendo, você contorna, briga, se acerta e segue até que, de repente, ela se parte. Calma, eu ainda tenho muito o que falar.
Durante um mês inteiro eu me julguei, senti raiva dele e de mim, perdi meu caminho, até mesmo minha fé. Quantas já passaram por isso? Se você não sabe dizer eu vou te apontar algumas: as mães de vocês. E essa foi a corda que eu encontrei para subir do poço e voltar a realidade.
Como mãe juramos que faremos tudo diferente. E algumas de fato precisam fazer isso. Já conversamos que existem mães e mães. Não somos cópias, não devemos ser, mas podemos relembrar o que Renato Russo nos deixou como reflexão “Você culpa seus pais por tudo. Isso é um absurdo. São crianças como você. E é o que você vai ser quando você crescer”.
Por isso comecei esse artigo com a necessidade de nos partirmos em muitos pedaços para compreender os pontos dessa loucura que é ser mãe. Você compreende cada detalhe quando encara seu passado. Eu, por exemplo, fui uma adolescente horrível, já confessei e hoje estou em paz com isso porque, de verdade, eu me tornei uma boa filha, mas preciso voltar para este ponto.
Quando adolescente minha mãe era a minha inimiga. Eu não via e nem acreditava nela como alguém com quem eu pudesse contar, porque eu estava perdida e confusa e não enxerguei quando ela, muitas e muitas vezes, esteve lá por mim. Eu tinha meus hormônios enlouquecidos, na minha geração com ideias contraditórias (as defendidas pela sociedade da época), o adulto era sempre o mais hipócrita, o que menos entendia o mundo e por tabela, os filhos. Diga a verdade, você também passou por isso.
Porque adultos, mães em especial, precisam ser mães, mas também precisam ser provedoras, e precisam ser mulheres, e precisam ser alguém, e isso assusta pra caramba. No momento em que tudo o que queremos é a compreensão para coisas que não há como compreender. Nossas mães lutavam contra um mundo louco para que ele servisse para nós, para que pudéssemos estar aqui, nessa conversa, com direito a desabafos, a encontrar a paz em situações que antes nos consumiam.
Quando olhei para mim e me vi na idade do meu filho eu enxerguei minha mãe com um emprego fixo que exigia dela oito horas por dia, com a sua chegada em casa, sempre cansada e precisando dar atenção aos filhos, se preocupar com escolas, com organização de casa, com comida e com todas as besteiras que eu aprontava enquanto ela estava fora.
E doeu, porque sempre dói encarar seu passado quando o objetivo é aprender com ele. Mas me ajudou de uma forma inacreditável. O que antes era mágoa se transformou em amor. Eu entendi a rebeldia do meu filho porque um dia eu fui esse adolescente que achava que sabia mais do que meus pais, que exigia o que sabia não ser possível, que ao invés de se sentar e conversar sobre suas dores, enlouquecia.
E sabe o que mais eu entendi? Que toda e qualquer pessoa, com as devidas ressalvas e preocupações, precisam passar por isso, experimentar a adolescência, ter seus próprios conflitos, aprender a cair e levantar. Você sabe e eu sei que como mães estaremos lá, do lado, ou em algum cantinho sem ser percebida, pronta para amparar, para abraçar e confortar, pronta para ser o suporte que ele precisará quando encontrar o seu limite, e ressalto que precisamos disso, a que aponta os erros mesmo, a que não passa pano ou não finge que está tudo bem.
Então a conversa com você, mãe de adolescentes ou futuros adolescentes é para te dizer que eu sei e entendo a sua dor. É de fato desesperador não saber mais o que dizer ou fazer para que seu filho encontre um caminho e eu não estou te dizendo para sentar e esperar passar, porque pode dar certo para alguns - poucos -, não para todos.
Filhos, independente da idade, quer saber que você se importa, mas em especial, na adolescência, esse se importar não é querer obrigá-los a falar, ou forçar a barra para uma amizade que naquele momento ele não quer. O se importar é estar ali, atenta, como um soldado no posto, observar e identificar cada detalhe para pegar os sinais e assim, entender qual o próximo passo que se deve dar. É reconhecer os limites necessários, mas, acima de tudo, o espaço também.
Hoje eu encaro como uma guerra silenciosa. Às vezes recuo, às vezes avanço, sem nunca desistir, porque eu amo meus filhos - nunca vou cansar se dizer isso -, e quando quis ser mãe, eu quis sabendo que aqueles bebês lindos um dia cresceriam, se revoltariam, bateriam a porta e me deixariam de fora de muitos momentos que eu gostaria, mesmo reconhecendo a impossibilidade, de estar dentro.
Por isso, não vou te dizer que passar por isso é complicado e está tudo bem, porque não está e de verdade, nenhuma mãe que está nessa situação quer ouvir isso. Mas eu vou te dizer que estará, que você viveu isso, que sabe que passa, sabe que eles voltam, eles sempre voltam, assim como você voltou, como eu voltei para a minha mãe e hoje tenho ela como a minha melhor amiga.
Não desista, não se afaste, não se consuma por mágoas ou culpas, não crie uma terceira guerra mundial em sua casa. Só respire e ame. Ame muito o seu filho nesse momento em que, mesmo sem dizer, ou permitir, ele só quer ser amado.
É isso. Eu volto a qualquer momento com mais um desabafo, talvez sobre meu adolescente problema, ou quem sabe sobre o meu pequeno que não é mais um bebê, ou até mesmo com o meu mais velho que já se acha um adulto mais responsável do que eu. Isso é família, é vida e acima de tudo, é o que você ama. Então só respire.
Tatiana Amaral para. a coluna Maternidade