O BBB22 acabou de começar e a cota Gorda* (muitas vezes esquecida no churrasco) foi preenchida por Tiago Abravanel. Sua presença no programa recorde de audiência na emissora mais assistida do país é de extrema importância e não só apenas para as pessoas que podem (e vão!) se identificar com ele.
O corpo gordo ainda é visto e tratado com muito preconceito. A ele é associado preguiça, gula, falta de força de vontade, doença, repulsa, vergonha… E ver um homem bem-sucedido e de pazes com o próprio corpo vestindo uma sunga e curtindo o verão como todos os outros participantes (magros!!!), contribui para a identificação (de outras pessoas gordas) e naturalização (que é importante para as pessoas independente do peso).
Os corpos gordos precisam ser naturalizados e quanto mais rápido isso acontecer, melhor. Na TV, nos livros, na publicidade, nos esportes, nos cinemas… Por muito tempo eles foram escondidos e apagados. Por roupas imensas, pela mídia, pela vergonha, pela falta de representatividade. E ligar a TV e ver o Tiago curtindo a si mesmo é um importante passo na constante luta contra a gordofobia.
De 2002 (ano da primeira edição) a 2022 (edição atual) já passaram 367 participantes pela casa mais vigiada do Brasil. E dá para contar nos dedos quantos deles eram gordos. A edição de 2021, por exemplo, prometeu diversidade, mas não contou com nenhum participante gordo, exatamente como aconteceu na primeira, 20 anos atrás.
“Emagrecer não é uma vitória, assim como engordar não é uma derrota.”
Na edição de 2020, nós acompanhamos Babu Santana passando por uma série de provas e atividades que simplesmente não foram pensadas para corpos maiores como o dele. E ainda teve o episódio onde os participantes precisaram escolher duplas e ninguém cogitou ele ou Victor Hugo. Os dois, que acabaram sobrando, fizeram a prova juntos. Ao apontar gordofobia para os demais brothers e sisters, logo todos estavam se justificando. “Só quem sofre, sente. Já que estão falando de feminismo, racismo, vamos falar de gordofobia”, propôs Babu após a prova.
E embora o BBB22 mal tenha começado, já é possível vermos Tiago Abravanel passando por situações fruto da gordofobia estrutural. Em seu segundo dia de programa, ele descobriu que a toalha da casa onde ficará confinado pelas próximas semanas não tem o tamanho adequado para o seu corpo.
Embora seja muito importante ter pessoas gordas nos representando em todos os espaços, é importante frisar que esses espaços não foram feitos para nós. A gente os invade com os dois pés na porta e os ocupa porque sabe da importância, mas não é uma tarefa fácil. A toalha que não enrola no corpo, o roupão que não fecha, as provas com espaços estreitos, tudo isso é um lembrete que nos diz “aqui não é o seu lugar”. E a se a gente for teimoso e quiser provar o contrário, vai precisar passar por pequenas agressões dentro e fora do programa.
Quem não se lembra da Paulinha Leite, da décima primeira edição, sendo zombada internet afora e comparada a um porco?
Já na edição de 2019, tivemos a Rízia sendo vítima de gordofobia nas redes sociais após beijar o participante gringo Alberto Mezzetti. As pessoas disseram que ele só a beijou porque as participantes magras não o quiseram. Disseram, sem um pingo de bom senso ou vergonha na cara, que ela era a “opção mais fácil”.
“O corpo do outro não é da sua conta.”
Por que o nosso corpo, gordo, não pode ser desejado? E quando é, por que as pessoas o questionam ou ficam tentando encontrar milhões de justificavas para tal?
Isso sem contar as falas gordofóbicas reproduzidas pelos próprios participantes ao longo do programa. Na edição de 2021, por exemplo, Sarah Andrade foi extremamente gordofóbica ao mencionar que as amigas gostosonas do colégio estavam imensas (naquele tom horrível de que fracassaram na vida).
O óbvio também precisa ser dito, então finalizo esse texto lembrando que emagrecer não é uma vitória, assim como engordar não é uma derrota. E, só pra não perder o costume, vai aquele lembrete maroto: o corpo do outro não é da sua conta.
Thati Machado para a coluna Gorda, sim!
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*eu uso a expressão cota gorda de maneira irônica porque é raro ter um corpo gordo lá dentro e, quando tem, é só um mesmo, para preencher a “cota”.