Nessa matéria vamos falar de uma forma diferente de uma expressão que existe na nossa sociedade, que é totalmente invisibilizada, e para dar início a uma discussão sobre a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), é importante entender a definição de cultura e seus atravessamentos a partir da comunicação. Roque de Barros Laraia define cultura como: “O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma herança cultural, ou seja, resultado da operação de uma determinada cultura.”
O que Laraia quer dizer aqui? Que uma pessoa é formada a partir do seu espaço cultural, ou seja, é a partir da troca com outras pessoas, a convivência, o contato, que vai começar a definir sua personalidade, seus trejeitos, até mesmo os seus gestos, mas me fala, como uma pessoa que não é compreendida, nem ouvida dentro do seu meio, consegue ter a sua primeira identidade a partir do seu povo?
Quando eu digo povo, eu quero dizer sobre diferentes diversidades culturais entre povos, tribos, grupos, sociedades, garantindo a pluriculturalidade comum no país atualmente, mas é importante frisar que dentro desta diversidade existem subcamadas diferenciadas e que não são notadas, e esse é um ponto diretamente ligado a exclusões e segregações que atravessam a liberdade de um indivíduo, como é o caso de pessoas surdas e pessoas com deficiência auditiva.
O maior desafio nos tempos atuais, é trazer em pauta a discussão para a interseccionalidade, a qual, segundo Akotirene, “possibilita compreendermos a fluidez das identidades subalternas impostas a preconceitos, subordinação de gênero, de classe e raça e as opressões estruturantes da matriz colonial moderna de onde saem.”, ou seja, é necessário olharmos para as dessemelhanças existentes dentro da pluriculturalidade, um olhar que sem dúvida, só é possível no momento que exista um discurso equiparado, àquele que cada indivíduo tenha espaço suficiente, e além de espaço, cada indivíduo tenha a instrumentalização adequada na sua formação como cidadão, para que sejam colocadas suas individualidades, objeções e necessidades a partir das suas próprias convicções.
Mas Nil, o que a Constituição já fez para amenizar esse caos? Eu te conto:
A lei n° 5.626 garante o direito à saúde de pessoas surdas ou com deficiência auditiva nas redes do Sistema Único de Saúde (SUS), além de garantir a estas pessoas total prioridade no atendimento, mas vamos à prática?
Segundo Mazzu-Nascimento, foi identificado que dos 5.317 cursos de graduação na área da saúde, apenas 2.293 (43,1%) ofereciam disciplina de Libras, sendo a maioria optativa, ou seja, nosso país não consegue assegurar nem tampouco o básico e necessário para vida de pessoas surdas ou com deficiência auditiva.
Diante disso, bora falar sobre linguagens e formas de comunicação acessíveis?
A lei nº. 10.436/2002 assegura a comunicação de surdos sinalizantes brasileiros como língua natural e consequentemente sua primeira língua de instrução, porém são poucas as medidas tomadas a partir disso. O primeiro exemplo, é justamente o fato da LIBRAS não fazerem parte da educação básica, possibilitando que qualquer pessoa saiba se comunicar com pessoas surdas, um fator totalmente segregador, que impossibilita a troca entre linguagens, entre indivíduos.
A partir disso, a lei 13.278/2016 assegura a construção de conhecimento a partir da experiência artístico-educacional da pedagogia do teatro como componente curricular obrigatório na educação básica. Pensando através desta lei, é importante entender como um educador é capaz de transformar totalmente a vida de uma criança, e para isso, o profissional da educação precisa entender antes de tudo, a necessidade de compreensão de cada um dos seus alunos, com toda contribuição e diversidade, que podem ser instrumentos de cena, de debate, de troca. Um ponto muito importante dentro da educação, é sem dúvidas, entender que cada ser humano tem suas próprias singularidades, inclusive, pessoas surdas. É comum em diversos espaços, públicos ou privados, o afastamento de pessoas surdas, de forma que pessoas ouvintes criem um distanciamento, incluindo todas as pessoas que possuem deficiência auditiva em uma única caixinha, como se todos fossem a mesma pessoa e tivessem as mesmas inquietações.
Para finalizar, levanto um desafio para que nossas leitoras busquem entender os atravessamentos que existem na sua tribo, grupo, família, roda... bora buscar entender cada singularidade e buscar fortalecer os nossos irmãos, que muitas vezes se sentem incapazes de serem ou de realizarem algo, buscar cada vez mais, um ambiente saudável e cooperativo, em que todas as pessoas, de diferentes raças, credos, etnias, deficiência, gênero ou sexualidade se sintam abraçadas um pelos outros, se sintam capazes de serem, de experimentarem, de vivenciarem o que há dentro de si.
E até a próxima!
Nil Mendonça para a coluna Corpos sem filtro
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