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O amor para além da exclusividade


A primeira vez que ouvi o ted talk com a psicoterapeuta belga Esther Perel, estávamos meu marido, os nossos dois filhos pequenos e eu fazendo uma linda viagem por várias cidades no sul da Itália. Nós dois na ocasião, juntos por 7 anos, eu tinha me mudado do Rio do Janeiro para a Suécia depois de tê-lo conhecido pela internet, uma história de amor comovente, que inclusive virou livro, o Encontros de neve e sol. Embora nos amássemos profundamente, era nítido que a paixão vulcânica tinha dado lugar a um outro sentimento, mais tranquilo, satisfatório, caseiro, menos erotizado. Esther Perel falava sobre a morte de Eros e o difícil balanço entre a domesticidade, a segurança em uma relação e o desejo por novidade e aventura. A fala da carismática terapeuta nos pareceu perturbadora porque parecia espelhar o que estávamos sentindo. Lembro de termos ficado em silêncio, um pouco constrangidos - mas intimamente curiosos para saber mais, era uma semente sendo plantada.


Naquela ocasião, eu ainda não tinha sido apresentada às possibilidades para além da monogamia compulsória e normativa: nunca alguém tinha me dito que era possível, ou muito menos correto, se envolver seja emocionalmente ou sexualmente com mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Que essa prática pudesse contar com o consentimento das partes envolvidas então, muito menos. O que era familiar? Conceitos como traição, adultério, pecado, pouca vergonha, falta de caráter. Mas como poderíamos nomear as relações amorosas que buscavam se aproximar da honestidade, comunicando abertamente sobre as asas do desejo, buscando acordos, combinados, novas experiências de mergulho na expansão do amor e erotismo para além da exclusividade seja afetiva ou sexual?


Aos poucos fui entendendo que diferentes formas de amar vinham sendo nomeadas e estudadas a partir do conceito guarda-chuva de “não monogamia consensual” o que inclui uma variedade de práticas, sendo “swing” (ou troca de casais), “relacionamento aberto” e “poliamor” os mais representativos. No Brasil, a “não monogamia política” tem tido bastante força atualmente, embora os adeptos dessa corrente descartem a ideia de fazer parte do conceito guarda-chuva. Essas formas de se relacionar, embora distintas em suas dinâmicas, acordos e estruturas, compartilham pelo menos como intenção, o pilar comum do consentimento mútuo e da comunicação honesta. 


No conhecido formato “monogâmico”, alinhado com o machismo estrutural, muitas de nós podíamos apenas aceitar os véus, as exigências de “virgindade”, os cintos de castidade, os apedrejamentos e pena de morte em caso de envolvimento extraconjugal, ou o estigma e a perda da respeitabilidade se nos comportássemos para além da castidade, enquanto homens passeavam tranquilamente entre cortesãs, frequentando bordéis e amantes sem serem punidos. 


A minha coluna na MS sobre Não Monogamias vai se dedicar a explorar os diferentes aspectos de relações contemporâneas, seja trazendo resumos de pesquisas acadêmicas e livros atuais sobre o tema, quanto reflexões pessoais e um convite à inspiração para novas perguntas. 


A psicoterapeuta Jessica Fern fala que assumir que o amor romântico precisa ser monogâmico e heterosexual para ser genuíno é um julgamento apressado, equivocado e normativo. Ela inicia o seu último livro, Polywise (2023), com as perguntas mais comuns feitas às pessoas não monogâmicas: “você não tem medo de sentir ciúmes?”, “o que está faltando na sua relação para você querer abrir?”, “seria o primeiro passo para o divórcio?” Fern argumenta que a transição para a não monogamia é menos sobre o que falta em uma relação e mais sobre a expansão da visão de mundo e do entendimento sobre o amor. É sobre o livro dela que vou falar na próxima coluna.


Você tem uma pergunta até lá? E ah! O mais importante: se você se identifica e está suave e alinhada com a monogamia, aproveite a sua escolha, abrace a sua preferência. Todas as formas de amar consensuais e honestas são bem-vindas! Aguardo ansiosamente o contato de vocês. 


Ilana Eleá para a coluna Não Monigamias

Encontre-a no Instagram: @ilanaelea



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