A verdade é que o pai mente, que a mãe esconde, que a amiga camufla e que o namorado trai. A verdade tem mil faces e todas são verdadeiras, depende só da narrativa empregada.
O homem que fez uma performance em seu show agiu mal porque incitou o ódio e fez apologia à violência. Ele pode até ter cometido um crime, se pensarmos bem. Mas, por outro lado, buscando uma verdade mais condizente com a dele, encontramos um argumento poético, aquele que se mistura com a sobrevivência da sua alma ou do seu ego ferido; ali, no espaço cinza de suas emoções mais críveis, ele ousou demonstrar sua dor através de chamas ofuscantes em um alguém que poderia ser um boneco, um avatar ou um desenho animado. Não importava realmente o instrumento da sua arte, mas valia o esforço em demonstrar o que lhe queimava por dentro, na forma de uma alegoria pirotécnica.
Ali, no meio de uma multidão, ele defendia seu ponto de vista, gritava sua dor e fazia sua arte. Mas muitos viram as verdades que suas óticas reluzentes apontavam, indicando com precisão que o ato foi irresponsável.
Lembro-me de uma exposição na qual fui uma das que levantou a voz da razão dentro do senso comum de que uma imagem que fazia alusão a um menino travesti era inapropriada. Não enxerguei, por certo, a verdade de tantos outros, que vivenciam essa dimensão de dor e destratos sociais. Vi somente a minha versão de todos os fatos que ali me eram apresentados.
Escondi de mim a verdade dos outros e montei um repertório de boas sequências narrativas, onde pude defender o que me era caro no momento, mesmo tendo trocado de canal em exatos 20 segundos, enquanto eles voltavam para suas casas e passavam pelas mesmas ruas esburacadas.
Hoje sou um ser com menos opinião e mais verdades compartilhadas. Aprendo com as vivências de cada um e admito minhas falhas sempre que minha visão fica turva a respeito de algum aspecto cotidiano.
Sou eu, em uma imensidão de verdades genuínas, que busca entender o próximo, a partir dos outros pedestais e sem a arrogância de buscar encontrar algo genuíno nos meus interesses burgueses.
Afinal, somos todos humanos, violentos e mentirosos...
Fui! (Buscar outras verdades...)
Cris Coelho para a coluna Aquela que habita em mim
Encontre-a no Instagram: @crisreiscoelho